Em debate promovido pela Fundação Grupo Volkswagen, especialistas discutem como a inclusão produtiva só acontece com continuidade, escuta e coragem para mudar estruturas
No ano em que completou 45 anos, a Fundação Grupo Volkswagen promoveu um encontro especial no Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo. O evento celebrou sua trajetória com uma programação voltada ao futuro. Entre os momentos mais marcantes esteve a mesa de debate “Diversidade e inclusão produtiva como aliadas no combate às desigualdades sociais”, realizada em junho, mês do Orgulho LGBTQIAPN+.
Mediada por Maria Ruanes, analista de Responsabilidade Social da Fundação, a conversa reuniu Maitê Schneider, fundadora da TransEmpregos; Adriana de Nanã, diretora do Instituto Social Cultural Brasil e sacerdotisa do Ilê Axé Omo Nanã; e Jonathan Berezovsky, fundador da Migraflix. O encontro trouxe olhares plurais e experiências profundas sobre inclusão, preconceito, soluções concretas e a urgência de promover permanência nos espaços.
A exclusão tem cor, classe, gênero e CEP
Ao longo do debate, os convidados fizeram questão de lembrar que a diversidade não é um tema novo — e nem deve ser encarado como passageiro. “A exclusão tem nome, tem sobrenome, tem território. Quando falamos de diversidade, falamos de gente que foi sistematicamente deixada de fora das oportunidades”, resumiu Maria Ruanes logo na abertura.
Ela provocou: “Não dá para falar em mobilidade social sem olhar para o racismo, a transfobia, o capacitismo, a LGBTfobia. E também não dá para fingir que as empresas e o poder público não têm responsabilidade sobre isso.”
Maitê Schneider: ‘Não é sobre contratar. É sobre garantir permanência’
Com humor afiado e frases marcantes, Maitê Schneider ressaltou o quanto o discurso de diversidade ainda está, muitas vezes, preso ao marketing. “Diversidade não é o que você vê na campanha de final de ano. É o que você vê na liderança. É quem decide, quem tem orçamento, quem pode errar e ser promovido.”
Ela também defendeu a importância de políticas de continuidade. “Não adianta contratar uma pessoa trans se ela não consegue ficar. É sobre estrutura. Sem ambiente seguro, não tem inclusão. E sem continuidade, não tem transformação.”
Segundo Maitê, a inclusão produtiva de pessoas trans, negras e periféricas exige mais do que capacitação técnica. “A gente precisa de tempo para sonhar. Bolsa de estudo, apoio psicológico, ambientes de escuta. E principalmente: parar de medir diversidade só por número de vagas.”
Adriana de Nanã: ‘Cuidar é também uma prática política’
Representando o saber ancestral e o cotidiano das periferias, Adriana de Nanã trouxe um discurso potente sobre a intersecção entre território, ancestralidade, cuidado e resistência. “Quando eu falo de diversidade, falo também de terreiro, de favela, de mulher preta que cria seus filhos sozinha, que segura a rede comunitária quando o Estado falha.”
Ela defendeu que a inclusão real passa por acolhimento, afeto e permanência, destacando que “ninguém se desenvolve com fome ou sem dignidade”. Para Adriana, os projetos sociais precisam respeitar os saberes locais, oferecer tempo e dar apoio de verdade.
“Tem muita gente dizendo que quer transformar, mas não sabe ouvir. Não escuta o território, não vê quem está segurando a barra lá na ponta. A transformação começa quando alguém é ouvido pela primeira vez sem ser julgado.”
Jonathan Berezovsky: ‘A burocracia é a nova fronteira da exclusão’
Falando sobre os desafios dos imigrantes e refugiados no Brasil, Jonathan Berezovsky trouxe dados e experiências práticas. Segundo ele, pessoas migrantes enfrentam múltiplas barreiras: idioma, documentação, acesso ao crédito e preconceito.
“Quando alguém tem um sotaque diferente, já parte de um lugar de desconfiança. É como se tivesse que provar mais do que os outros que pode estar ali.” Ele destacou que programas de inclusão produtiva precisam envolver formação técnica, redes de apoio e acesso a financiamento, especialmente para quem quer empreender.
E foi direto: “Não basta boas intenções. A burocracia também exclui. O papel do setor privado é ajudar a construir soluções. Se a empresa quer ser diversa, precisa olhar para a porta de entrada e também para a permanência.”
‘A mobilidade social é coletiva’
Como mediadora, Maria Ruanes costurou o debate com sensibilidade e firmeza. Ao longo da conversa, fez questão de reforçar que a escuta ativa, o cuidado e a continuidade são os pilares para qualquer transformação real.
Ela emocionou o público ao dizer: “Quando uma jovem negra entra na faculdade, ela leva junto sua mãe, sua vizinha, sua comunidade inteira. A mobilidade social não é sobre um indivíduo. É sobre um território inteiro que começa a sonhar junto.”
Um debate que vira convite
O encontro mostrou que diversidade não é caridade, nem exceção: é justiça. E a Fundação Grupo Volkswagen, ao colocar o tema no centro da celebração de seu aniversário reafirmou seu compromisso com a construção de um Brasil onde todas as pessoas — independentemente de gênero, cor, orientação, origem ou condição — tenham o direito de sonhar e viver com dignidade.
“O que aconteceu aqui não foi uma mesa. Foi um espelho. Um chamado à ação. Diversidade não é tendência, é responsabilidade”, finalizou Maria.
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